segunda-feira, 28 de março de 2011

Sporting Clube de Portugal


Já se passaram mais de quarenta e oito horas desde que terminou um acto eleitoral que, para mim, quase de certeza devido à estúpida aflição severa que esmaga o meu espírito sportinguista, tem de ser caracterizado como infame e terrivelmente catastrófico, duas noites cinzentas desde que senti, desde que presenciei, com uma impotência emocionalmente devastadora, uma alegria pessoal, indescritível, a esfumar-se no ar gélido da madrugada de Domingo, e uma desolação raivosa se instalou nos corações leoninos de muitos milhares de simpatizantes, adeptos, e sócios de uma centenária e orgulhosa instituição desportiva, detentora de uma história lendária, factualmente grandiosa, meritória, séria, marcada desde os primórdios da sua fundação, em mil novecentos e seis, por uma pioneira preocupação social, e um conjunto de regras de conduta que eram exemplares para a época, e que hoje em dia são inatacáveis. O Sporting, como é comum dizer-se nos círculos verdes e brancos, é um clube realmente diferente, mas presumo que o que nos verdadeiramente captou a imaginação enquanto crescíamos a ouvir os nossos pais e avós a falar do nosso clube, para além dos seus valores e princípios, é o seu historial recheado de títulos, conquistas que nos foram dadas, com suor e lágrimas, por jogadores míticos e equipas imbatíveis, cujos nomes e denominações ainda hoje recordamos com nostalgia, os resquícios de uma era de glória há muito perdida.

O Sporting de hoje, o Sporting da integridade, do realismo, da contenção, da derrota digna, da punchline das piadas feitas por adeptos adversários, por muito que me custe a admiti-lo, e ao contrário de outros indivíduos que, a julgar pelo senhor carismático que, supostamente, elegeram para a presidência, vivem de olhos fechados, é uma sombra ténue da força desportiva que já foi em décadas passadas. Os títulos são esporádicos e, na sua maioria, insignificantes no plano desportivo actual, o que não impede um conhecido comentador desportivo de afirmar que a última década foi, em termos de resultados, a melhor desde o tempo dos Cinco Violinos. Os dirigentes são de uma mediocridade vergonhosa, seres raquíticos que percebem tanto de futebol como o americano comum, comprando jogadores medianos, com pouca ou nenhuma qualidade, por quantias exorbitantes e que, como é natural, não conseguem rentabilizar em campo, e por consequência no mercado; estamos a falar de dirigentes sem uma centelha de competência, fúria, ou personalidade para se degladiarem com os presidentes dos outros clubes, de lutarem pelos interesses do Sporting perante as organizações que regem o futebol português, incapazes de se insurgirem contra uma banca que suga a força vital do clube, e de romper com um passado, com um modelo desportivo, que é sinónimo de derrota ininterrupta, mas que, no entanto, são capazes de se sentarem ao lado de um homem que se gaba de os terem deixado de mão estendida, que goza com um funcionário da instituição que tem mais integridade na ponta de um cabelo do que o Papa em questão tem em todo o corpo, que telefonou para um compadre que tinha na Liga e lhe pediu para castigar um ex-jogador leonino. Eu dos treinadores nem falo; são tão competentes como uma actriz de filmes porno a interpretar uma peça de Shakespeare.

Muitos, na maioria jovens, visivelmente os gajos mais inconformados com a situação preocupante em que o Sporting está mergulhado há já demasiados anos, acalentavam o desejo desesperado de verem no passado fim-de-semana uma mudança radical no paradigma de gestão do SCP, de verem eleito um líder que pusesse o clube num caminho em que os obstáculos não eram um entrave à grandeza, mas sim um incómodo temporário. Dos cinco candidatos que se apresentaram a eleições, apenas um, na minha óptica, tinha a postura forte e as condições fundamentais para executar essa putativa mudança: Bruno de Carvalho. A sua vontade férrea, e uma personalidade fria, calma, a ocultar uma paixão doentia, explosiva, fazia-o sobressair. O seu discurso era motivador, diferente, sem subterfúgios, e as propostas claras, o rumo nítido. As calúnias e os insultos desprezíveis com que os outros quatro o começaram a bombardear assim que a sua presença simpática se transformou numa inconveniência séria aos seus objectivos, e quase todas vindas da boca do fuinha que agora pede união em torno do seu berrante reinado, e dos seus apoiantes, que a julgar pelos comentários que já li revelam ter a elevação e a educação de um verme, tiveram o condão de atrair mais membros para a sua causa. Às cinco da manhã o sonho da mudança parecia que iria concretizar-se; todas as informações que passavam cá para fora o indicavam. Às seis, e após uma série de eventos nebulosos e recambulescos, percebi que o pesadelo iria, possivelmente, continuar por mais quatro anos. Não era desta que os receios e as inseguranças que me perturbam quanto ao futuro dos leões, e que não me permitem ter paz, se iriam esfumar. Assisti, preocupado, ao estalar da violência; vi, com admiração, o sentido de responsabilidade de um homem que tem genuinamente os interesses do clube em mente. O que é que restou daí? A corja que levou o Sporting Clube de Portugal à ruína iria continuar a arrastar o seu nome pela lama. Luís Duque e Carlos Freitas são homens competentes, é verdade, mas também são nomes do passado. Temos que começar a olhar para o futuro. Tudo ainda pode mudar (a inconsistência no número de votos contados, a estranheza de mil e quinhentos votantes não serem suficientes para dar uma vitória clara, os pedidos de recontagem que supostamente foram pedidos e não aconteceram, as palavras de felicitações de Rogério Alves a Bruno de Carvalho, a disparidade entre as informações que foram sendo difundidas ao longo da noite, a impugnação das eleições), mas até que a ala conservadora, até que a dinastia Roquette, até que a velhada que corrói as fundações nas quais o Sporting está alicerçado, que temendo o que não conhece, se dispõe a abraçar uma segurança destrutiva, seja destronada de um trono que não é deles... o que é que se pode fazer?

Bettencourt devia ser o ponto final de uma política claramente falhada, e Sábado o início de uma nova era, uma era de mudança, uma era de esperança. O mundo do futebol é brutal, não é para ingénuos. Só nos resta continuar a lutar... ou esperar.

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